quarta-feira, 1 de julho de 2015

Então eles vieram por mim

Em 01 de julho de 1937 o pastor luterano Martin Niemöller foi preso, acusado de "atividades contra o Estado" pelo regime nazista.

O reverendo Niemöller era um conservador e um nacionalista notório, como eram de maneira geral os líderes das igrejas luteranas alemãs. Diante da campanha ultranacionalista que levou o partido nazista ao poder em 1933, ele deu as boas vindas ao novo chanceler Adolph Hitler. Ele apoiava a perseguição aos comunistas (que ele via como promotores do ateísmo) e deixava transparecer opiniões antissemitas em seus sermões, embora ele discordasse das políticas racistas contra a etnia em si, protegendo judeus convertidos ou cristãos filhos de judeus na sua igreja.

O ponto de tensão entre Niemöller e o programa nazista veio desse detalhe. Niemöller, junto com outros pastores protestantes, se opunha à perseguição determinada por raça, uma vez que suas igrejas abrigavam fiéis de todas as etnias, inclusive de origem judaica. Em 1934 ele ajudou a fundar a Igreja Congregacional em resposta à pressão do governo em "nazificar" as igrejas protestantes. Essa exigência do governo batia de frente com uma promessa que Hitler lhe fez pessoalmente antes de se tornar chanceler de que protegeria a igreja e que não haveria aprisionamentos e confinamento de judeus na Alemanha. No entanto, até pelo menos 1935, o reverendo ainda atacava os judeus de fé, insinuando em pregações que eles estavam sofrendo um castigo merecido.

A sua atitude ambivalente, possivelmente uma aposta dupla em pretos e vermelhos, acabou dando errado. A sua resistência em levar para as igrejas o programa nazista acabou levando-o para a prisão. Depois de 8 meses encarcerado, ele foi condenado a 7 meses de prisão e multa. Como ele já havia cumprido o termo em prisão provisória, foi liberado imediatamente sob pagamento de multa. Mas ao deixar o tribunal, foi novamente preso por agentes da Gestapo e conduzido ao campo de concentração de Sachsenhausen.

Confinado junto a outros presos políticos cujas prisões ele apoiara antes, sujeito agora às mesmas privações, violências, e vendo suas vidas ceifadas sem qualquer piedade, Niemöller refletiu profundamente sobre suas atitudes e reconheceu o erro em apoiar Hitler. Eventualmente ele seria transferido para o campo de Dachau, e de lá, em 1945, seria transportado para a Áustria, mas o transporte foi abandonado pela SS em vista do crescente avanço aliado em direção à Alemanha. Ali ele foi libertado.

A partir de 1946, Niemöller passou a pedir perdão pela sua inação diante dos abusos dos nazistas contra determinados setores do povo alemão, admitindo sua própria culpa e exortando os demais alemães a fazerem o mesmo. Foi dele a iniciativa da Declaração de Stuttgart, em que as igrejas protestantes assumem a responsabilidade de não protegerem as pessoas da violência do Estado. O reverendo ainda se tornaria um ativista do pacifismo, a favor do desarmamento nuclear e contra a Guerra do Vietnã.

O reconhecimento da responsabilidade civil de proteger o direito do cidadão como o seu próprio é sintetizado no célebre poema de sua autoria, derivado das suas pregações, e que os usuários do facebook já devem ter lido com alguma autoria apócrifa, preferencialmente de Berthold Brecht... Esse não é o poema demagogo de algum "esquerdopata", nem uma modinha da "esquerda caviar" de se condoer por pessoas com quem realmente não se importam tanto assim. É a confissão de alguém que achava que estava por cima da carne seca e que não devia nada a ninguém, até que seus aliados se voltaram contra ele e lhe tiraram tudo, como ele mesmo havia permitido que fizessem com quem ele pensava que merecia:

"Primeiro eles vieram pelos socialistas, mas eu não me opus-
Porque eu não era um socialista.

Então eles vieram pelos sindicalistas, e eu não me opus-
Porque eu não era um sindicalista.

Então eles vieram pelos judeus, e eu não me opus-
Porque eu não era um judeu.

Então eles vieram por mim - e não havia mais ninguém para falar por mim."

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