sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

O Tigre e o Dragão

Em 29 de janeiro de 1258, um exército invasor mongol foi derrotado e expulso de Thang Long (atual Hanói) por forças do império de Dai Viet, impedindo a expansão do poderoso Império Mongol sobre o sudeste asiático.

Em 1258, Kublai Khan ainda era um dos possíveis herdeiros do colossal (porém fragilmente constituído) Império Mongol. Ele herdara as terras correspondentes ao norte da China, tomadas da antiga dinastia Jin por Genghis Khan e seu filho Ogedei, e governava a partir dali a recém fundada dinastia Yuan. Mongke Khan, então o Grande Khan do Império, tinha pretensões de lançar-se em campanha contra a metade sul da China, ainda não subjugada e controlada pela dinastia Song. Seu plano incluía um ataque em três frentes: uma vindo do norte da China, uma vindo do oeste, e outra do sul.

Kublai foi mandado a conquistar o reino de Dali, na atual província chinesa setentrional de Yunnan. Depois de enfrentar dificuldades com as defesas naturais de Dali, aparentemente um traidor local teria indicado uma passagem segura para os mongóis. Talvez esse traidor tenha sido o próprio rei, que, abertamente, mais tarde, se uniu aos mongóis em troca de uma posição no governo ("marajá") da nova província. Com Dali conquistada, restava a Kublai assegurar sua posição no norte do Vietnã, então controlado pelo império de Dai Viet para lançar a terceira frente contra os Song.

Kublai procurou negociar a rendição de Dai Viet enviando Uriyangkhadai, filho do brilhante general de Genghis Khan, Subodai. Os mensageiros de Uriyangkhadai, contudo, foram presos. Em tempos anteriores, a recusa em atender aos emissários mongóis (ou responder com sua prisão ou execução) teve resultados catastróficos; a maior cidade da Ásia, Merv, foi completamente destruída e a maior parte da sua população assassinada em 1221 (com talvez mais de um milhão de mortos em dois dias de ataque, incluindo até os animais domésticos, é possível que tenha sido a maior catástrofe provocada por seres humanos em um lugar só antes do emprego da pólvora) após recusar uma exigência de rendição. O príncipe de Dai Viet, Quoc Tuan, com certeza tinha algo em mente quando tomou essa atitude. Ou pouco juízo.

Uriyangkhadai mobilizou uma força de 40 mil mongóis e 10 mil Yi (grupo étnico daquela região entre Vietnã, Yunan e Mianmar) para conquistar Dai Viet à força. O general avançou durante o mês de janeiro de 1258 em direção à capital Thang Long.

A primeira grande batalha se deu perto da capital. Duas companhias mongóis desciam o Rio Vermelho esperando bloquear possíveis rotas de fuga da cidade, enquanto Uriyangkhadai cavalgava com o grosso do exército para forçar um primeiro ataque. Os Tran (a dinastia reinante de Dai Viet) haviam posicionado uma linha de elefantes de guerra na cidade atual de Viet Tri. Os mongóis ainda não estavam familiarizados com esse tipo de animal no campo de batalha, e no primeiro momento tiveram dificuldade em controlar a suas montarias, nervosas por causa do estranho odor dos elefantes. Além disso, os Tran haviam posicionado barcos rio abaixo para impedir a travessia e permitir a fuga em caso de necessidade. Uriyangkhadai percebeu a importância dos barcos e ordenou um ataque direcionado a eles. No caminho, os invasores encontraram uma passagem segura para a outra margem. Por ali conseguiram se aproximar dos elefantes. Eles atiraram flechas incendiárias aos seus pés. Os animais entraram em pânico, causando enorme confusão e destruição no exército defensor, Uma outra vitória no dia seguinte, perto de um dos portões da cidade, abriu caminho para os mongóis.

Em vista de uma invasão implacável, a população de Thang Long foi evacuada para uma ilha próxima ao delta do Rio Vermelho. O imperador chegou a cogitar uma fuga para a China Song, mas foi dissuadido por alguns conselheiros de Estado. Por volta do dia 25 de janeiro, os mongóis entraram na capital viet praticamente deserta; dos emissários presos, um estava morto. Uriyangkhadai, insultado, ordenou uma destruição generalizada e a execução de quem quer que pudesse ser encontrado no lugar. Conquistar a capital sem conquistar seus governantes era uma vitória inócua. Além disso, os vietnameses não deixaram suprimentos para trás. Uriyangkhadai precisaria alimentar talvez os 30 mil homens que restavam com poucos recursos, ou abortar sua campanha.

A fome se tornou imediatamente um problema, mas a ela se somaram também fatores naturais: o calor e a umidade afetavam os cavaleiros mongóis e seus cavalos, nativos das áridas e frias estepes da Mongólia. Mosquitos espalhavam doenças para as quais eles não conheciam tratamento, como a malária. Uriyangkhadai ainda procurou enviar mais dois emissários ao imperador, exigindo rendição, mas os dois foram presos. Com a liderança mongol hesitante e seus homens enfraquecidos, o imperador ordenou um contra-ataque. Ele entrou na cidade montado num grande elefante à frente de seu exército, encontrando apenas a retaguarda do exército inimigo, que já iniciara a sua retirada, em Dong Bo Dau, subúrbio da atual Hanói. Houve pouca resistência, e, de fato, a moral entre os mongóis estava tão baixa que eles marcharam e cavalgaram até a fronteira com Dali sem sequer tentar atacar ou saquear as vilas e templos pelo caminho.

Os mongóis ainda tinham então a reputação de serem praticamente invencíveis; no ocidente, a expansão mongol iniciada com Genghis Khan no começo do século só foi detida em 1260 na Síria. Dai Viet, e mais tarde seus vizinhos Champa (a metade sul do atual Vietnã), Khmer (no Camboja), Myinsaing (no centro de Mianmar) e Thai (o coração étnico do povo tailandês, ainda em formação na época) imporiam uma resistência feroz às seguidas tentativas de invasão mongol. A morte de Mongke Khan em 1259 também atrapalhou decisivamente os planos para o sudeste asiático. De fato, Kublai Khan, enquanto seu sucessor como Grande Khan e imperador da China (após conquistar os Song), embora seja lembrado como administrador e por sua relação com o mercador genovês Marco Polo, nunca conseguiria avançar efetivamente suas fronteiras para além da própria China, fracassando repetidamente no sudeste asiático (onde algumas nações aceitaram pagar tributo para serem deixadas em paz), em Java, e no Japão.

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